2007/04/30

Lótus

Fui comprar gladíolos e cravos vermelhos às floristas do cemitério dos Olivais. Vendem-nas mais baratas do que as floristas dos centros comerciais. Como se os mortos merecessem um desconto. Lembrei-me das flores que as mulheres, agachadas sobre os cestos de vime, vendem à entrada dos templos hindus e das outras flores que se vendem nos mercados, nas praças, no caminho que vai de Margão para Loutolim. Eu, a entrançar o cabelo, a enchê-lo de flores, cravos amarelos, hibiscos, a olhar-me no espelho do quarto, a achar-me por breves instantes bonita, assim escura, feita de sol, sabendo a sal, a angústia e a tristeza cativas nos nós das minhas veias, eu, a sair para o quintal com uma flor de lótus presa no elástico, a ouvir as gralhas lá no alto, falando entre si, sem perceber que escarneciam da minha vaidade.